Arquidiocese de Braga -
2 novembro 2021
“Com a visita aos cemitérios redescobrimos o essencial”
DACS com Avvenire
É o padre Luigi Guglielmoni, sacerdote da diocese de Fidenza, em Itália, e especialista em ritos de despedida, a dizê-lo.
Enterrar os mortos é uma das sete obras de misericórdia corporais indicadas no Evangelho de Mateus. Mas, talvez visitar os cemitérios, levar uma flor, acender uma vela nos túmulos dos nossos entes queridos, acariciar furtivamente as suas lápides, no dia da comemoração dos mortos, até possa ter o mesmo valor. E com valor acrescentado quando se olha para a pandemia.
“Porque nos permite aprender a arte de recomeçar”. Esta é a convicção a que chega o sacerdote da diocese de Fidenza e especialista nos ritos de despedida e bênção dos mortos, o padre Luigi Guglielmoni. Não é por acaso que, nestes meses, o presbítero que dirige a paróquia de San Bartolomeo Apostolo em Busseto – a mesma onde na capela adjacente dedicada à Santíssima Trindade se casou o muito jovem Giuseppe Verdi com Margherita Barezzi em 1836 – publicou com o leigo Fausto Negri o belo ensaio “Sofrimento: drama e mistério. Meditação e orações”, para tentar dar uma resposta significativa ao tema do luto e da dor causada pela morte dos nossos entes queridos.
“Lembro-me sempre da imagem da ostra e da pérola que Gustave Flaubert nos oferece nos seus textos. O grande escritor francês comparou a dor à pérola de uma ostra. E as suas palavras foram memoráveis: «A pérola é uma doença da ostra e, no entanto, é uma realidade infinitamente preciosa; a dor é como um refinamento de nós mesmos, uma penetração mais intensa e completa na nossa alma e na realidade». Acho que essas palavras ajudam-nos a entender como o sofrimento nos pode ajudar a crescer e «refinar»”, conta o sacerdote.
Um tema, o do sofrimento, que para o Pe. Luigi está relacionado com o ser quase confrontado com a “irmã morte” nos meses passado. “Eu mesmo contraí Covid e fui hospitalizado na unidade de terapia intensiva de Parma. E perguntei ao Senhor por que me salvou milagrosamente em comparação com os meus outros companheiros de viagem. Uma experiência que me ajudou a ir ao essencial e a não fazer projectos a longo prazo”, diz.
Nestes dias dedicados à visita aos cemitérios, o Pe. Luigi conduzirá a sua bicicleta para celebrar os ritos, mas também para trazer uma palavra de conforto a quem lhe peça.
“O que pude vivenciar em tantos ritos fúnebres que aconteceram durante os meses de restrições de saúde e confinamentos foi a raiva e o desamparo de tantas pessoas que não puderam participar do rito de despedida dos seus entes queridos”, explica.
Um sofrimento, o do “luto à distância”, aos olhos deste sacerdote, que obrigou muitas pessoas a participarem quase remotamente e de forma tardia no funeral dos seus familiares.
“O que mais faltou foi poder saudar os entes queridos pela última vez, fazer uma pausa no silêncio interior e exterior diante dos caixões, colocar um bilhete ou uma foto ao lado do corpo que dissesse tudo sobre aquelas vidas que já não existem mais. Creio que estes gestos simples, mas também simbólicos, que faltaram devido à pandemia, permitem-nos agora processar, na medida do possível, um luto que permanece para os que aqui ficam como uma «poda violenta» dos seus entes queridos”, diz.
Uma viagem pelos cemitérios que também pode simbolizar algo mais. Exactamente como nos dizem os epitáfios de “A Antologia de Spoon River”, do escritor americano Edgar Lee Masters.
“Parando em frente aos túmulos dos nossos conhecidos, olhando as fotos e lendo a data de nascimento e morte, devemos questionar-nos sobre o que nos dizem hoje e o quanto o exemplo das suas vidas pode ajudar-nos a sermos melhores cristãos, menos zangados e distraídos em relação às coisas que realmente importam. Pode representar um bom exame de consciência para a vida quotidiana. E assim, como diriam os antigos, podemos aprender a «morrer para nós mesmos», ao nosso amor próprio e permanecer em oração pensando apenas no essencial”, conclui.
Artigo de Filippo Rizzi, publicado em Avvenire, a 2 de Novembro de 2021.
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