Arquidiocese de Braga -

20 setembro 2022

Rien Schuurhuis: “O ciclismo ensinou-me a dar o melhor de mim”

Fotografia DR

DACS com Vatican News

Testemunho do ciclista da “Athletica Vaticana” sobre o desporto como veículo de encontro.

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Desde que cheguei a Roma, em 2020, fui imediatamente atraído pelos valores e espírito comunitário da Athletica Vaticana. A atenção do Papa Francisco ao desporto como veículo de encontro está em profunda sintonia com a minha experiência de vida. A linguagem do desporto é realmente universal. No espírito da encíclica do Papa Francisco, Fratelli tutti.

Representar a Athletica Vaticana a 25 de Setembro, na Austrália, na estreia no Campeonato Mundial de Estrada da União Ciclística Internacional (que a 24 de Detembro de 2021 reconheceu a Associação Polidesportiva Vaticana como membro oficial) é uma honra incrível para mim. Houve um bonito trabalho de equipa para chegar a este ponto e espero levar esse espírito de equipa para a corrida.

O desporto tem o poder de impelir cada um de nós a dar o melhor de si, abraçando a generosidade, o sacrifício e a humildade. Na Athletica Vaticana estamos prontos para levar esses valores ao Campeonato Mundial e incentivar todos os atletas a serem “embaixadores” do desporto como veículo de inclusão, fraternidade e paz: estas são as palavras que o Papa proferiu no início de Julho à Athletica Vaticana para os Jogos Mediterrâneos na Argélia.

Vamos ver como será a corrida mundial. Sempre tive uma queda pelos desfavorecidos: gostaria de ver ganhar um atleta de uma das nações emergentes do ciclismo. O eritreu Biniam Girmay, por exemplo, mostrou estar à altura. O percurso de Wollongong combina comigo: amo as subidas, mas tenho o físico para pedalar nas planícies. Gosto de correr e colaborar com ciclistas de outras equipas para chegar à linha de chegada. É realmente uma experiência extraordinária que o ciclismo confere.

Para a Copa do Mundo treinei bem. Moro com a minha família no centro histórico de Roma e, de todas as vezes, o meu treino começa com um aquecimento numa das ruas mais movimentadas: a Lungotevere. Devo admitir que é um dos traços mais divertidos do meu treino, também pelos reflexos que tenho de ter no meio do tráfego. Então, fora de Roma, pedalo ao redor do Lago de Bracciano e do Lago de Albano.

Também acompanho regularmente os meus dois filhos num passeio de bicicleta nas ruas de paralelepípedos do centro. Entre pedestres, carros e motas. É uma ótima maneira de ensiná-los a terem consciência do espaço e da gestão da bicicleta.

Afinal, desde que me lembro – nasci em Groningen, na Holanda, a 12 de Agosto de 1982 – o ciclismo sempre fez parte da minha vida. Na minha terra, a bicicleta faz parte da vida quotidiana. Vamos de bicicleta para o trabalho, para a escola, fazer compras e à igreja. O meu primeiro salário foi gasto numa bicicleta. Não sei exactamente quando nasceu o amor pelo ciclismo como desporto, mas acho que sempre esteve presente no meu coração. Eu torcia pelo espanhol Miguel Indurain. Admirava muito a sua modéstia e humildade dentro e fora do ciclismo. Ele foi uma inspiração para muitos jovens ciclistas. O oposto à personalidade vivaz do meu “herói de infância”, Mario Cipollini.

Ao longo dos anos, o ciclismo foi a base de muitas das minhas amizades, com pessoas de diferentes origens, educação e cultura. O desporto transcende a idade, o mais velho dos meus amigos ciclistas pode ser o avô do meu amigo ciclista mais jovem, linguagem e convicções. Essas amizades do ciclismo ajudaram-me a mergulhar nos lugares em que eu vivi e visitei. Ajudaram-me a entender as diferentes culturas e a crescer como pessoa. O ciclismo ensinou-me a dar o melhor de mim.

Realmente, o ciclismo, e o desporto em geral, foi para mim uma excelente maneira de me integrar nas comunidades de todo o mundo. Em 2009, me mudei para a Austrália com a minha esposa e, desde então, vivemos na Índia, no Pacífico Francês e agora na Itália. Em cada um desses lugares encontrei amigos e partilhei experiências através do desporto. A Austrália, agora a minha segunda casa, ensinou-me como o desporto pode unir. Metade da população australiana nasceu ou tem um pai nascido no estrangeiro, com uma incrível mistura de culturas e línguas. O desporto cria laços que transcendem essas diferenças.

Na Índia, nunca esquecerei que participei numa meia maratona em Nova Deli ao lado de uma mulher que corria descalça e, no calor escaldante, com a cabeça coberta. Trocamos um sorriso e algumas palavras de apoio. Na Nova Caledónia, embora eu não soubesse falar francês, liguei-me a vários jovens ciclistas, alguns dos quais eram indígenas Kanak. Como eles tinham pouco apoio e dinheiro disponível, foi um verdadeiro privilégio poder treinar alguns deles e ajudá-los a adquirir bicicletas e outros materiais para fazer desporto.

Corri a pé e de bicicleta por toda a Ásia e Pacífico, na Malásia, Indonésia, Nova Zelândia e Polinésia Francesa. Uma das experiências mais incríveis foi uma corrida ciclística na ilha das Flores, na Indonésia. Fomos acolhidos em vários mosteiros que pontilham a ilha enquanto completávamos as etapas: uma experiência espiritual que nunca esquecerei. As ruas estavam cheias de espectadores, parecia que toda a ilha tinha vindo torcer por nós. As pessoas apoiavam todos os ciclistas, independentemente da raça, cor da pele ou religião.

Artigo de Rien Schuurhuis, publicado em Vatican News a 20 de Setembro de 2022.