Arquidiocese de Braga -

24 março 2024

Nova Ágora lembra que Direitos Humanos é um processo em constante construção

Fotografia DM

DM - Francisco de Assis

Os palestrantes destacaram que a defesa dos Direitos Humanos é, por um lado, dever de todos, até porque, são intemporais e não estão garantidos

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Fechou, na noite de sexta~feira, dia 22, o pano da edição das Conferências Nova Ágora 2024, organizadas pela Arquidiocese de Braga, este ano sobre a Inteligência Artificial (IA). Na última conferência, os  intervenientes Susana Mourato Alves-Jesus, Maria Manuel Leitão Marques e o cónego Eduardo Duque, diretor do evento, lembraram que a defesa dos Direitos Humanos é, por um lado, dever de todos, até porque, são intemporais e não estão garantidos; e por outro, é um processo que está sempre em construção.

Com o título “Direitos Humanos”, a terceira e última conferência desta edição teve como oradoras Susana Mourato Alves-Jesus, doutorada em História pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, licenciada e mestre em Estudos Clássicos e que, atualmente, é gestora do projeto “Dignipédia Global: Sistematizar, Aprofundar e Defender Direitos Humanos em Contexto de Globalização”; e Maria Manuel Leitão Marques, licenciada em Direito pela Universidade de Coimbra, doutorada e agregada em Economia, deputada no Parlamento Europeu.

Como todas as conferências, esta também decorreu no Espaço Vita, e contou com a presença do Arcebispo de Braga, D. José Cordeiro; o seu Bispo Auxiliar, D. Delfim Gomes, entre outras individualidades ligadas à cultura, ao mundo académico e à sociedade portuguesa, além de um bom número de cidadãos.

A abertura da sessão esteve a cargo do cónego Eduardo Duque que, após as boas-vindas às oradores e às autoridades presentes, falou da «profunda honra e sentido de responsabilidade» para se dirigir aos presentes na conferência dedicada aos Direitos Humanos.

E as primeiras palavras foram para invocar a importância atemporal dos Direitos Humanos. 

Os Direitos Humanos são os direitos inalienáveis e invioláveis inerentes a todos os seres humanos, independentemente da sua raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou outra condição. Eles representam os valores universais da dignidade, igualdade e liberdade, sendo o pilar fundamental para a construção de sociedades justas, pacíficas e inclusivas. Como nos lembra a Declaração Universal dos Direitos Humanos, no seu Art.º 1.º, “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”», referiu

Continua a haver flagrantes violações dos Direitos

O diretor da Nova Ágora recordou que ao longo dos séculos, a humanidade travou inúmeras batalhas para conquistar e proteger estes direitos fundamentais. Desde a Declaração de Direitos de Virgínia em 1776, passando pela Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão em 1789, até à Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948. “Cada passo representou um avanço significativo na consolidação destes valores tão preciosos”.

O cónego Eduardo Duque corrobora as palavras do Papa Francisco, que lamenta que muitas vezes constata-se que os Direitos Humanos «não são iguais para todos».

“Ainda hoje, em pleno século XXI, assistimos a flagrantes violações dos Direitos Humanos em várias partes do mundo. Genocídios, torturas, trabalhos forçados, discriminações de todas as ordens e tantas outras atrocidades continuam a ocorrer, manchando a consciência coletiva da humanidade”.

O responsável citou Nelson Mandela para dizer que “ninguém nasce a odiar outra pessoa pela cor da sua pele, ou sua origem, ou sua religião. Para odiar, as pessoas precisam de aprender, e se elas podem aprender a odiar, podem também ser ensinadas a amar”.

O cónego Duque referiu que, infelizmente, os direitos fundamentais continuam a ser desafiados por conflitos armados, pobreza extrema, alterações climáticas, crises migratórias e retrocessos políticos em diversos países.

“É nossa obrigação moral e ética lutar incansavelmente contra estas ameaças, promovendo a educação e a consciencialização da sociedade, incentivando a participação ativa dos cidadãos, bem como o envolvimento dos movimentos sociais e das organizações não-governamentais”.

Segundo o diretor da Nova Ágora, o Papa alerta a sociedade que «ainda estamos longe duma globalização dos Direitos Dumanos mais essenciais. A fome é criminosa e a alimentação é um direito inalienável. Juntamente com esta necessidade elementar, uma outra vergonha para a humanidade que a política internacional não deve continuar a tolerar é o tráfico de pessoas, um flagelo que não se pode adiar mais».

No final, D. José Cordeiro interveio para agradecer aos presentes e à organização e fundamentou a importância destes debates e dos Direitos Humanos em particular.

Na edição de amanhã do Diário do Minho, traremos não só as palavras do Arcebispo de Braga, as intervenções das duas conferencistas, bem como das questões levantadas no debate que se seguiu.

 

Conferencistas defendem literacia digital e recato na divulgação dos dados na “net”

 

“O momento que vivemos está longe de nos deixar tranquilos”, disse Madalena Oliveira, referindo-se às inúmeras violações dos Direitos Humanos. 

Uma deixa para passar a palavra a Maria Manuel Leitão Marques, com o tema “Direitos humanos e Inteligência Artificial”. Apesar das ameaças mais ou menos explícitas, preferiu introduzir sempre um tom otimista em relação ao futuro.

A antiga ministra da Presidência e da Modernização Administrativa é uma especialista nas novas tecnologias. Basta recordar que Maria Manuel foi a criadora do “Simplex”, ambicioso plano de modernização administrativa em Portugal. Mais recentemente, esteve diretamente envolvida na criação do Primeiro Regulamento sobre a Inteligência Artificial, que visa garantir uma IA fiável, segura e que respeite os direitos fundamentais da União Europeia. E entre os direitos fundamentais estão os Direitos Humanos Universais.

A oradora começou por dar casos práticos da IA que no dia a dia vão fazendo a diferença na vida das pessoas, melhorando a sua vida, com mais dignidade e respeito pelos seus direitos. 

Assim, deu o exemplo de uma fábrica têxtil que visitou anteontem em Famalicão, onde os trabalhos duros, sujos e pouco saudáveis já são feitos por máquinas.

Outro exemplo positivo que deu foi o P5, da Universidade do Minho, programa de medicina à distância, facilitando a vida dos cidadãos.

Maria Manuel também vincou a ideia de que não há direitos adquiridos. “Houve tempos em que se pensou assim. Mas já não”.

Esta especialista considera que há que globalizar os Direitos Humanos, incluindo-nos também nos Acordos Comerciais que, na União Europeia, têm que ter uma componente dos Direitos Humanos. Ou seja, evitar ou pelo menos restringir negócios com países que violam os direitos humanos. O que é sempre uma matéria sensível.

 

Cuidado na criação dos algoritmos

Entrando diretamente no tema da Inteligência Artificia e os Direitos Humanos, a oradora advertiu que o problema está, muitas vezes, na construção dos algoritmos. 

Porque é aí que reside o perigo. Seja pela introdução de fatores discriminatórios, sejam elas de raça, cor, religião ou orientação sexual; seja pela privacidade dos dados médicos, ou influenciando resultados eleitorais.

Por isso, enalteceu o regulamento aprovado pelo UE, para minimizar os riscos de crimes e de violações dos Direitos Humanos. 

A oradora concorda com Luc Julia que diz que “a IA não existe. O que existe é a nossa inteligência aumentada”.

Mas Maria Manuel deixou ainda um alerta: “O importante é que sejamos nós a controlar a tecnologia e não o contrário. Não podemos perder as rédeas de controlo da Inteligência Artificial”. Uma afirmação aplaudida e corroborada por todas as intervenientes.

 

 Francisco de Assis

 

As oradoras da terceira e última conferência da edição 2024 da Nova Ágora defendem uma forte aposta na literacia digital, desde tenra idade, para se estar preparado para aquilo que aí vem; e pediram muito recato de todos na colocação de dados pessoais na internet. No evento anual, organizado pela Arquidiocese de Braga, a conferencista Susana Mourato Alves-Jesus lembrou as escravaturas modernas, que violam os Direitos Humanos, bem como a desigualdade no acesso às novas tecnologias.  

Vale a pena retomar a ideia de ser o homem a ter o domínio da Inteligência Artificial e não o contrário. “A inteligência Artificial tem que ser sempre a nossa inteligência aumentada. Ou seja, os homens têm de estar  sempre no comando das  operações”.

Os principais recados foram no sentido de haver uma aposta, por um lado, na literacia digital e por outro, recato na colocação de dados na internet.

“Porque depois de os partilhar, deixam de ser nossos”, alertou Maria Manuel Leitão Marques. 

Por seu turno, Susana Mourato Alves-Jesus concorda que a «Inteligência Artifical não nos pode fugir das mãos. Por isso, é fundamental apostar na literacia digital, para que as nossas crianças se tornem adultos conscientes» sobre esta ferramenta que, não sendo nova explodiu de uma forma preocupante, sobretudo pelo mau uso que pode ter. 

Daí a importância da regulação. A União Europeia já deu um mote e espera-se que, à semelhança de outros dossiês, aconteça o chamado «efeito Bruxelas», ou seja, que outras zonas do globo sigam o exemplo da regulamentação.

Acredita-se que os Estados Unidos, sobretudo com Joe Biden, vá, aos poucos, introduzindo alguma regulamentação. 

No entanto, teme-se que, se Trump regressar à presidência dos Estados Unidos, haja nova regressão.

Em relação à China, as preocupações são outras, isto é,  um controlo excessivo dos dados e da tecnologia, violando os direitos dos seus cidadãos e não só.

Respondendo a perguntas do público presente, Maria Manuel Leitão Marques garantiu que o Regulamento da Inteligência Artificial da União é flexível o suficiente para incorporar novas medidas e sugestões.

Aliás, uma das questões levantadas foi no sentido de a Declaração Universal dos Direitos Humanos estar desatualizada.

Susana Mourato discorda. Por um lado, por entender que se trata de um documento completo; e por outro pela sua importância e caráter histórico.

 

Ainda hoje vêem-se barcos com gente em condições indignas

A gestora do projeto “Dignipédia Global: Sistematizar, Aprofundar e Defender Direitos Humanos em Contexto de Globalização” mostrou aos presentes uma pintura do século XIX, sobre a forma como os escravos eram transportados de um continente para outro; ou como os escravos eram tratados, como objetos, violando os seus direitos básicos.

No entanto, a investigadora chamou a atenção para a repetição da história, em certo sentido, com uma escravatura moderna. E exibiu uma nova imagem, essa bem recente, dos barcos no Mediterrâneo, a transportar pessoas, em condições igualmente indignas.

“Não se sabe se são homens, mulheres e crianças livres ou escravos, de uma certa forma. Certo é que as condições em que são transportados violam a sua dignidade e os seus direitos”.

Apresentou um vídeo sobre a ação da “Dignipédia Global”, com depoimentos de personalidades de vários quadrantes e posições sociais. Para mostrar que a defesa dos direitos humanos é tarefa de todos e todos podem e devem fazer a sua parte.

 

Arcebispo de Braga agradece a todos

A última palavra coube a D. José Cordeiro, o anfitrião do evento. Por isso, no final das intervenções, fez questão de agradecer a todos.

“Um profundo agradecimento às três. Foi um gosto ouvi-las, com a sensibilidade feminina e com bom humor. Também em parte responderam à pergunta que trouxe cá durante as três sessões, fazendo eco do Papa Francisco. Ou seja, como é que podemos continuar plenamente humanos e contribuir para o bem, nesta revolução cultural e digital, nesta mudança de época. Em parte, ajudaram a encontrar a resposta, suscitando sempre novas perguntas. O cónego Eduardo Duque já agradeceu e eu queria agradecer-lhe a ele e à toda a sua equipa. Também participei neste repensar da Nova Ágora, aqui no Espaço Vita, esta praça aberta, com as questões abertas que nos ajudam a tornar mais humanos, mais fraternos, mais pessoas de esperança. Queremos continuar nesta confiança na humanidade. Muitos de nós estivemos presentes nas três sessões, penso que concluímos bem. Queria desejar a todos uma Santa Páscoa”.