Arquidiocese de Braga -
22 outubro 2025
Missionário intrépido da Esperança
Homilia do Arcebispo, D. José Cordeiro, no dia de S. Martinho de Braga - 22 de outubro de 2025
1. Até à plenitude da inteligência
Celebramos o padroeiro principal da nossa amada Arquidiocese, S. Martinho de Braga, um dos grandes no Reino dos céus, porque no seu tempo ele soube praticar e ensinar os mandamentos de Jesus Cristo.
Conhecemos a vida e a ação de Martinho enquanto bispo de Dume e de Braga. Sabemos a sua importância para a conversão dos Suevos que dominavam esta região, levando-os do arianismo, heresia que negava a divindade de Cristo, à ortodoxia cristã. Martinho foi fundamental para Igreja do seu tempo, conduzindo os crentes «à plenitude da inteligência, o conhecimento do mistério de Deus, que é Cristo, no qual estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento» (Col 2,2).
Na sua obra De correctione rusticorum, o seu escrito mais peculiar e, por isso, o mais estudado pelos académicos, Martinho mostra toda a sua inteligência, toda a sua cultura e toda a sua fé. Com o texto procura reconduzir os batizados aos compromissos cristãos, uma vez que, esquecidas das promessas assumidas no dia do seu batismo, muitas pessoas entregavam-se aos costumes das crenças mágicas, em reminiscências que nem a cultura romana conseguiu apagar.
Na verdade, São Martinho começa assim a instruir os rústicos ou ignorantes: «desejámos, filhos caríssimos, instruir-vos, em nome do Senhor, nalgumas coisas que ainda não ouvistes ou das quais vos esquecestes», porque «começaram a prestar culto às criaturas, esquecendo o Criador. Uns adoravam o sol, outros a lua ou as estrelas, uns o fogo, outros a água subterrânea ou as fontes das águas...».
2. Seguir Jesus Cristo
E prossegue São Martinho: “Considerai, portanto, o pacto que fizeste com Deus no batismo. Prometestes renunciar ao diabo e aos seus anjos e a todas as suas obras más, e confessastes que críeis no Pai, e no Filho e no Espírito Santo, e que esperáveis a ressurreição da carne e a vida eterna. (...) Como é que alguns de vós, que renunciastes ao diabo e aos seus anjos, aos seus cultos e às suas más obras, agora tornais outra vez aos cultos do diabo?”.
Nos dias de hoje, há também muitos batizados esquecidos das promessas assumidas no batismo e reassumidas de viva-voz no dia do Crisma. Vivem como se Deus não existisse, agem como pagãos ou fazem um deus à sua medida e ao seu gosto pessoal, caindo na idolatria. Esta idolatria leva-nos a endurecer o coração, retirando Deus do centro das nossas vidas, e por consequência sendo incapazes de reconhecer os outros como irmãos, aos quais somos chamados a amar e a servir.
Seguir a Cristo implica radicalidade, não no sentido de fazermos algo espetacular, que nos distinga dos outros, mas no sentido de provocar uma transformação total do nosso ser. Isso exige de nós um esforço, exige sacrifício, porque não nos é inato darmos a Deus a primazia nas nossas vidas e viver unicamente com a nossa confiança posta n’Ele.
Sim, «Congratulemo-nos e dêmos graças a Deus, porque somos, não somente cristãos, mas... Cristo. Compreendeis, irmãos, estais convencidos de que a graça de Deus reside em nós? Admirai, regozijai-vos; tornámo-nos Cristo. Ele é a cabeça, nós somos os membros. O Cristo total é Ele e nós... Quem é a cabeça e quem são os membros? É Cristo e a Igreja. Seríamos presumidos e soberbos tomando para nós esta dignidade, se ela não fosse prometida por Cristo...» (Santo Agostinho, Ev. João 21, 8).
3. Ser sal, ser luz
Cristo pediu aos seus discípulos que fossem sal da terra e luz do mundo. Todavia, “A fé não é um pouco de mel na boca para enganar o sabor de um comprimido amargo. Por vezes, é uma coisa que arde, como o sal numa ferida. Mas exatamente por isto impede-a de “apodrecer”. Somos chamados a ser sal, e não mel” (Luigi Maria Epicoco, Sal, não mel, p. 178).
Se queremos ser luz para o mundo, temos então de iluminar aquilo que no mundo, na Igreja, e em nós precisa de se converter ao Evangelho. Se queremos ser sal da terra não podemos ficar pelas meias medidas, inclusive sobre nós próprios, mesmo sabendo que ser sal vai fazer com que a ferida arda; mas ao ser sal estamos a dar o primeiro passo para a cura dessa ferida, a qual nos impede a fidelidade total ao Evangelho.
+ José Manuel Cordeiro
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